Decisão sem powerpoint

“The most common source of mistakes in management decisions is the emphasis on finding the right answer rather than the right question“. (Peter Drucker, The practice of management, 1954)

Quem nunca teve que preparar uma apresentação para uma discussão em um comitê ou reunião de diretoria, e passou horas (próprias ou da equipe) montando os gráficos, tabelas, as 110 páginas de anexos, e especialmente uma narrativa convincente no melhor estilo das grandes consultorias para vender seu caso? Ou ainda, preparando uma apresentação destas para o chefe apenas para, na noite anterior à reunião, ele devolver tudo rabiscado para ficar “do jeito dele”.

Pior do que o uso ineficiente de energia organizacional é o modelo mental que sustenta este hábito tão arraigado nas empresas. Tornou-se uma não-questão a necessidade de se preparar uma apresentação para a deliberação sobre um tema. Talvez a facilidade trazida pela tecnologia de comunicação tenha contribuído para uso exagerado deste artefato, entretanto parece mais razoável que os softwares e aplicativos tenham tido maior sucesso por responder a uma demanda oriunda de crenças organizacionais mais profundas. No caso dos processos típicos de decisão nas alçadas mais elevadas da hierarquia das empresas ficam evidentes três crenças:

  1. A decisão é hierárquica (“preciso convencer o chefe”).
  2. Não existe tempo para discutir profundamente (“temos que decidir rápido”).
  3. Não existe valor na inteligência coletiva (“eu sei mais que o grupo”).

A forma (estética) sempre traz um significado profundo relativo à ação (ética). Estas crenças, explicitadas na prática da decisão, não são coerentes com uma organização que preza (ou prega) princípios como agilidade, horizontalidade, autonomia, ou alguma forma de colaboração. Os exemplos repetidamente vividos por gestores ao participar de reuniões e comitês, muitas vezes com sofrimento, são poderosos moldes de um comportamento que será absorvido e multiplicado em todos os níveis de decisão.

Esta não é, porém, uma uma paisagem homogênea. Dentre os casos de organizações buscando alternativas existem dois ótimos exemplos, simbólicos pela escala que estas empresas alcançaram.

Amazon e o memo de seis páginas

Em um a carta aos acionistas em 1997 Jeff Bezos explica a a abordagem decisória na Amazon. Não são feitas apresentações em PowerPoint (ou qualquer outro tipo de slides), são escritos memorandos de seis páginas estruturados de forma narrativa. A razão é simples: a necessidade de escrever ideias em frases e parágrafos completos produz uma clareza mais profunda sobre o que é realmente relevante. É importante notar o método de elaboração: os memos são escritos e reescritos, compartilhados com colegas que são solicitados a melhorar o trabalho, deixados de lado por alguns dias, e depois editados novamente com uma mente fresca.

Os memos são lidos silenciosamente no início de cada reunião em uma espécie de sala de estudos, dessa forma todo mundo tem tempo, e “o autor fica com a sensação agradável e calorosa de ver seu trabalho árduo sendo lido”. Só então se inicia o processo de discussão e encaminhamento.

Google, as telas de reunião e informação

Eric Schmidt, no livro “How Google works”, detalha a abordagem decisória no Google. As salas de reuniões tem duas telas, uma para videoconferência e anotação dos pontos principais da discussão, e outra com as informações pertinentes ao tema. A reunião tem início com o entendimento das informações, geralmente apresentadas por quem está mais próximo do problema. Há necessidade de imersão, foco e presença para reenquadramento do problema. Buscam-se então alternativas para se chegar à melhor ideia, e esta etapa requer divergências e conflitos saudáveis. A convergência para a melhor solução é orientada pelo consenso. Toda a abordagem requer inclusão e cooperação. Assim a etapa seguinte de planejamento e execução terá muito maior probabilidade de êxito.

A decisão como hábito angular

Muitos sócios e líderes sêniores tem intenção genuína de desenvolver uma organização viva – no sentido de ser capaz de aprender, compartilhar conhecimento estratégico para se adaptar, ter agilidade para reação coerente ante eventos inesperados no contexto do mercado. Para isto é necessário que a cultura seja embasada em princípios relacionados a autonomia, agilidade, colaboração e inteligência coletiva. Para que estes princípios sejam vitalizados na cultura o mais potente nutriente é um processo de decisão coerente. A ação de tomada de decisão talvez seja o hábito organizacional mais angular, isto é, um hábito que ressoa em muitas outras esferas de ação e comportamento da organização, e por isso tem função estruturante na cultura. Quando se consegue mudar um hábito angular, toda a cultura organizacional, por ressonância, estará também mais permeável para a mudança. É por este motivo que é necessário construir um significado e uma abordagem próprios para a decisão na organização, coerentes com a cultura e estratégia desejadas.

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