A importância da Inteligência Emocional na liderança

Você já deve ter ouvido a frase de que “as pessoas são contratadas por suas habilidades técnicas, mas são demitidas pelo seu comportamento”. Esta máxima, na qual acredito, surgiu com força há pelo menos 3 décadas no mundo do trabalho, e ainda assim, poucos a compreendem.

Na era digital, em que cada vez mais as habilidades técnicas são substituídas por processos e sistemas automatizados, e onde a inteligência cognitiva humana é substituída pela inteligência artificial, o desenvolvimento contínuo de habilidades comportamentais, ou “ soft skills” para ficar “chique”, é a chave para lidarmos com a complexidade e a incerteza, de agora e do futuro. É aí que entra a Inteligência Emocional, que é inclusive uma das 10 habilidades para o futuro listadas pelo World Economic Forum.

Quando eu comecei minha carreira na área de Treinamento e Desenvolvimento, em 1999, a Inteligência emocional era o hit do momento. O conceito de Inteligência Emocional foi definido academicamente pela primeira vez pelos psicólogos e pesquisadores estadunidenses Peter Salovey e John D. Mayer, a partir do artigo “Emotional Intelligence”, publicado na revista Imagination, Cognition and Personality”, em 1992. Mais à frente, em 1995, o psicólogo, escritor e Ph.D. de Harvard, Daniel Goleman, lançou o livro Inteligência Emocional, sendo responsável por popularizar o conceito. Finalmente emergia a compreensão de que Inteligência Cognitiva não era suficiente.

O livro de Goleman tornou-se imediatamente um sucesso estrondoso. Com o tempo, novas pesquisas foram complementando o assunto, outros temas foram se integrando, e o conceito se fortalecendo. O fato é que a Inteligência Emocional nunca mais foi deixada de lado e, especialmente no âmbito corporativo e da prática da liderança, tornou-se fundamental. Em um mundo de constantes transformações e incerteza radical a Inteligência Emocional é cada vez mais necessária.

De certa forma Goleman, Salovey e Mayer sistematizaram e evoluíram o que se entende por “emocional” . Charles Darwin já escrevia, no século 19, sobre a importância da expressão das emoções para a adaptabilidade humana. O que difere Darwin de outros pensadores, e isso era novidade na época, é que ele usa o termo “expressão” e não “controle” das emoções. Até meados do século XIX, acreditava-se que as emoções eram instintos básicos que deveriam ser controlados sob pena de uma pessoa ter a sua capacidade de pensar seriamente afetada. Ou seja, era preciso subjugar as emoções ao comando do Pensar, sendo esta a dimensão essencial do ser humano.

Rudolf Steiner
Rudolf Steiner

Como consultora e educadora que atua inspirada pela Antroposofia, é importante eu convidar para este baile de ideias o filósofo e educador Rudolf Steiner , este senhor da foto ao lado. Ele usava uma imagem trimembrada para olhar o ser humano, distinguindo três qualidades ou dimensões arquetípicas humanas: o Pensar, o Sentir e o Querer.

De uma forma muito simplificada, podemos descrever estas três dimensões da seguinte forma:

Pensar – Nossa razão. É no Pensar que residem os fatos, conceitos, argumentos e lógica. É o mundo das ideias, o que acontece na nossa cabeça. Sede do nosso sistema neurossensorial, através do Pensar captamos e processamos o que acontece, onde o mundo exterior se desmaterializa e se tonar imagem interior. A esta imagem interior conectamos outros conceitos que já temos gravados na memória, e assim vamos construindo nossa percepção do mundo. O Pensar é naturalmente frio. Por isso, quando precisamos clarear nossos pensamentos, é comum dizermos “preciso esfriar a cabeça”.

Querer – Nossas ações. É por onde colocamos os pensamentos em ação no mundo. E por onde reagimos de forma inconsciente, reproduzindo hábitos e comportamentos em resposta ao ambiente. Na nossa anatomia, a sede do Querer é o sistema metabólico-motor, que comanda metabolismo e movimentos de uma forma geral. Portanto, o querer é quente e pulsante. É a dimensão da ação, da implementação e da mobilização. Aqui residem a energia, hábitos, vontades, propósitos e motivação. É onde a imagem interior se coloca em ação no mundo exterior.

Sentir – Nossas emoções e o sentido que atribuímos ao que acontece. Na anatomia humana, o Sentir mora no sistema rítmico: coração, pulmões e sistema circulatório. Pode ser frio ou quente, antipático ou simpático, está sempre em polaridade em relação ao mundo exterior. Esta é a dimensão que estabelece a ponte entre o Pensar e o Querer, onde há constante troca centre o mundo interior e exterior, e nesta troca atribuímos um significado ou uma emoção ao que é percebido.

Somos condicionados a uma ligação direta entre Pensar e Querer. Racionalizar o mundo e focar em nossas ações práticas. Desenvolver a razão e adquirir novos hábitos.

No mundo organizacional o Pensar e o Querer são muito bem trabalhados: imaginar o futuro e planejar ações, tornar um conceito em algo prático no dia a dia. A questão é que o nosso Sentir é o grande responsável por conectar as ideias com as ações, atribuindo significados, emoções que podem contribuir ou atrapalhar a conexão entre Pensar e Querer, entre ideia e ação, na forma como desejamos.

Quantos planos estratégicos maravilhosos, desdobrados em planos de ação impecáveis, simplesmente não dão certo por conta da resistência das pessoas envolvidas?Aha! É o Sentir se manifestando: o que este plano estratégico, esse futuro desejado, significa para as pessoas? Pode haver medo que paralisa, antipatias baseadas na vivência de cada um, sentimentos de injustiça… e a resistência surge e empaca todo o processo.

“Deu frio na barriga…”

“Estou com um nó na garganta…”

“Respiração parou aqui…”

“Deu até tremedeira…”

“Meu coração parou naquela hora…”

Todos nós usamos expressões como estas, que são exemplos do nosso Sentir se manifestando.

Convidando Goleman e Steiner para “dançarem comigo neste baile”, digo que Inteligência emocional é abrir espaço para o nosso Sentir, e à partir dele transformar nossa ação.

Quanto mais consideramos o Sentir nos processos de Desenvolvimento (Organizacional, Pessoal, da Liderança, etc), mais consciência trazemos para esta dimensão, e assim damos a oportunidade às pessoas de lidarem com suas emoções e com as das pessoas ao seu redor.

Steiner, através da Pedagogia Waldorf, institui um modelo educacional que integra Pensar, Sentir e Querer. E Goleman prega que todos deveriam ser emocionalmente alfabetizados desde a infância, e nos bancos escolares deveríamos aprender sobre as emoções. Segundo Goleman, todos deveriam aprender e praticar, desde cedo, cinco características que desenvolvem nossa inteligência emocional:

  1. Autoconsciência: reconhecer e saber designar as próprias emoções, compreendendo as causas dos sentimentos, para discernir sentimentos de atitudes.
  2. Gestão das emoções: ao reconhecer suas emoções, você se torna capaz de melhor gerenciá-las e escolher como elas vão influenciar suas decisões e atitudes. Ao gerenciar melhor suas emoções, é possível canalizá-las em comportamentos funcionais e produtivos (melhorar sua comunicação, ser menos impulsivo, ser mais resiliente, etc.). As pessoas que têm essa capacidade tendem a ser muito mais produtivas e funcionais no dia a dia.
  3. Saber ler as emoções dos outros: ter empatia. Ao reconhecer, gerenciar e canalizar suas próprias emoções é possível desenvolver maior consciência social, ou seja, ter empatia para ler e interpretar os sinais do outro, adotar a perspectiva de quem está a seu lado, e maior sensibilidade em relação ao que o outro sente. Aliás, esta é uma competência fundamental para quem se coloca no papel de gestão e liderança de pessoas.
  4. Lidar com relacionamentos: é ser capaz de lidar com o mundo emocional do outro e com isso gerar bons relacionamentos interpessoais e se sair bem ao interagir com outras pessoas.

 

Em conjunto com Junto com Richard Boyatzis, Daniel Goleman elaborou um Inventário de Competências Emocionais e Sociais (ESCI), que são um desdobramento das características descritas acima:

  1. Autoconsciência emocional: Identificar nossas próprias emoções e os seus gatilhos.
  2. Autogestão emocional: Capacidade de manter as emoções e impulsos sob controle em condições de estresse, pressão ou euforia.
  3. Otimismo: Capacidade de ver o lado positivo das situações, e as oportunidades além dos obstáculos.
  4. Adaptabilidade: Agir com flexibilidade às mudanças, abrindo o coração para recebê-las.
  5. Empatia: Capacidade de se colocar no lugar do outro e extrair pistas sobre o que ele pode estar sentindo e por quê.
  6. Consciência Organizacional: Compreender e assimilar a dinâmica de um sistema, ambiente ou rede.
  7. Influência: Gerar impacto positivo sobre os outros, influenciar e obter apoio para suas iniciativas, com compaixão
  8. Treinamento e Mentoria: Ser capaz de compartilhar conhecimento e promover aprendizagem, através de feedbacks, suporte e orientações.
  9. Gestão de Conflitos: Sensibilidade e bom senso para encontrar soluções através de conciliações e acordos.
  10. Liderança Inspiradora: Inspirar e contagiar grupos, transmitindo confiança para extrair o seu melhor.
  11. Trabalho em equipe: Sensibilidade e bom senso para encontrar soluções através de conciliações e acordos.
  12. Orientação para Realização: Desafiar-se para superar os próprios padrões , com metas desafiadoras e riscos calculados.

 

Basta bater o olho na lista acima para entender por que o World Economic Forum cita a Inteligência Emocional com uma das 10 habilidades do futuro, essencial para crescer e se desenvolver profissionalmente.

Com o ritmo cada vez mais frenético de mudanças, e o grau cada vez mais alto de incerteza, a integração entre Pensar, Sentir e Querer, através do desenvolvimento da Inteligência emocional, é o que pode te preparar para navegar nestes mares turbulentos.

Sejamos espertos, não pelo nosso QI, mas por aquilo que vem do coração.

Bibliografia:

  1. Goleman, Daniel. Inteligencia Emocional,1995. Editora Objetiva.
  2. Moggi, Jaime. Liderando pela Essência. Editora Antroposófica.

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