Podemos começar aqui fazendo um paralelo entre a lagarta e a borboleta.
Toda lagarta é uma borboleta em potencial, as células germinais da borboleta vivem dentro da lagarta, mas nem todas se tornarão borboletas, transformando o potencial em competência.
Quando olhamos para essa condição nas empresas familiares podemos ver algo semelhante, todas as empresas têm um potencial de alçar vôos mais altos, tornando – se Famílias Empresárias, mas nem todas chegarão lá, pois, esse caminho requer muita paciência, persistência e um significado profundo de perpetuação, contexto que vamos explorar um pouco mais, logo a seguir.
Esse caminho de desenvolvimento permite às empresas familiares ampliarem o seu legado e construir futuros significativos que possam ir além do grupo empresarial e das pessoas envolvidas diretamente aos negócios.
Agora vamos começar do início: empresas de família normalmente são personalistas, confundindo-se com uma pessoa, ou um pequeno grupo de pessoas, que se colocam à frente da organização, isso não deve ser visto como uma crítica ou demérito, mas a conexão pessoal é excessivamente grande e os valores das pessoas são naturalmente transferidos e permeiam a empresa.
Sem sombra de dúvida os resultados e conquistas dessa empresa em comunhão com essa pessoa, ou pequeno grupo de pessoas, fundadores, só se fez possível pelos méritos desses terem conseguido fazer uma leitura perspicaz das necessidades que estavam latentes no mercado e organizarem de forma eficiente um conjunto de ações, esforços e recursos para suprir essas necessidades.
Nesse contexto, a autoridade familiar e empresarial se misturam fortemente, são todos da família.
Esse fluxo costuma se manter vigoroso e estimulante, promotor de crescimento, até a fase que novas gerações começam a ascender na empresa, assumindo posições de comando e poder. Neste momento, o grupo começa a ampliar-se e potenciais conflitos e visões de mundo distintas se manifestam, tornando a empresa um palco de possíveis disputas, ainda que veladas.
Para dar conta dessas visões díspares começa a se fazer necessário a introdução de estruturas organizacionais que permitam que as diretrizes, princípios, valores e a autoridade moral dos fundadores sejam preservadas.
A pergunta que pode nortear esse momento: como podemos dar conta do presente sem corromper o que nos trouxe até aqui?
A complexidade aumenta e muitos se perdem por estarem praticando uma gestão emocional, onde as prerrogativas individuais podem prevalecer em detrimento do que é melhor para os negócios.
Para mitigar isso a elaboração de um acordo de acionistas e um código de conduta ajudam muito, conjuntamente a isso criar as estruturas mínimas de governança corporativa, com conselhos e diretoria podem mitigar problemas e clarear os fluxos decisórios.
Aqui vale muito a pena destacar que a simples criação dessas instâncias não muda nada o ambiente, se de fato os processos decisórios não forem impactados e distribuídos, por vezes encontramos casos em que as instâncias estão formalmente estabelecidas, mas os processos decisórios continuam a seguir os velhos hábitos, concentrados em poucas pessoas ou em uma pessoa. Neste cenário, o conselho e diretoria são utilizados somente como meros coadjuvantes, não sendo de fato gerada a responsabilização e a autoridade decisória para esses âmbitos institucionais.
A coisa fica mais ou menos assim: as reuniões ocorrem, o conselho se manifesta, a diretoria apresenta seus estudos e no final do dia olham para a pessoa que está a frente do negócio desde sempre e perguntam a ela: O que você quer que façamos?
Como podemos ver no breve relato anterior o ambiente não amadureceu, os órgãos foram criados, mas o poder não foi distribuído, o que gera comportamentos e hábitos decisórios danosos para o futuro da empresa.
Por outro lado, podemos perceber que as pessoas (fundadores em particular) e empresas que se propõem a viver um processo profundo e relevante de transformação, que venham a atravessar cenários de tensões que possam tirar a empresa do rumo, onde as turbulências seriam um artifício para realizarem escolhas inadequadas, seguindo os velhos parâmetros, verificamos que a presença de uma estrutura de governança, bem implementada e com distribuição qualificada de autoridades e responsabilidades, reforçada pela visão de futuro familiar consistente pode ser a “estrela guia” que orienta as ações do presente das instâncias de governança, suportada pelos valores familiares.
O amadurecimento desse fluxo mais consistente e verdadeiro em suas práticas decisórias distribuídas, permite a transferência de riqueza e o sucesso transgeracional.
Se tudo isso for feito podemos perceber uma mudança de qualidade nos ramos familiares ou nos integrantes das famílias, os desafios de lidar com as demandas do presente, onde precisa – se “matar um leão a cada dia”, começam a abrir espaço e uma transição se mostra possível, onde os temas imprescindíveis e importantes passam a ser mais pautados por uma responsabilidade com o legado recebido e como a família e as empresas lidarão com os temas do futuro, uma nova consciência começa a surgir, mais expandida.
O diálogo se estabelece dentro dos diversos fóruns decisórios com maior autonomia, dadas as estruturas incorporadas de Conselhos de Família, Sócios e Diretoria.
Essa estruturação diminui a probabilidade de conflitos e solavancos, todas as pessoas passam a cultivar a percepção que estão construindo, viabilizando os caminhos para o futuro. As Famílias Empresárias passam com maior consciência a elaborar planos estratégicos, estabelecer objetivos mais amplos socioambiental e cultural, comuns a todos, olhando o sucesso da família no longo prazo.
Neste momento, o processo de preparação e capacitação dos herdeiros ganha uma relevância significativa para dar continuidade aos negócios da família.
Nesta longa e exigente jornada de desenvolvimento contínuo, tanto pessoal quanto empresarial, as Famílias Empresárias passam a nutrir uma consciência sobre as suas responsabilidades que ultrapassam as fronteiras dos próprios integrantes da família e dos negócios.
Os membros das Famílias Empresárias desenvolvem plena consciência sobre as razões pelas quais devem se manter juntos como proprietários colaboradores, procurando intencionalmente uma coesão familiar, procurando – se retroalimentar um contínuo fluxo de desenvolvimento e sustentação da cultura familiar, proporcionando uma capacitação contínua dos membros da família para serem bons acionistas, empresários e executivos, contexto que viabiliza o surgimento de novas fontes de riqueza para todos os envolvidos.
Podemos reconhecer que estamos em um estágio maduro das Famílias Empresárias quando o Conselho de Administração e a Diretoria estão compostos em sua maioria por profissionais independentes, selecionados com base em suas competências e na experiência necessária para impulsionar a empresa a efetivar seus planos estratégicos.
Com essa estrutura as Famílias empresárias permitem que seus negócios enfrentem de forma mais consistente as mudanças contemporâneas dos mercados. Permitindo que os membros da Família Empresária tenham maior possibilidades e liberdade de se conectarem plenamente com o futuro, colocando-se cada vez mais a serviço do desenvolvimento de um ambiente próspero e saudável que vai muito além dos ganhos financeiros empresariais, promovendo uma mudança da realidade na sociedade que tanto contribuiu para que aquela família chegasse onde chegou, tendo como guia orientador pulsando nos corações, as sementes essenciais que os fundadores plantaram.
Tornar-se borboleta exige muita dedicação, força interior e disciplina, a implementação desse exercício familiares, empresariais e sociais permitirão alçarmos vôos mais altos, com leveza e beleza.